Na década de 1970 a segurança dos aeroportos, mesmo nos Estados Unidos, estava longe de ser como é atualmente, com um rígido controle que envolve de cães farejadores a equipamentos de alta tecnologia.
Não era preciso nem mesmo apresentar um documento para voar: bastava comprar o bilhete no balcão e seguir em direção ao portão de embarque para entrar no avião.
No dia 24 de novembro de 1971, um homem que se identificou à companhia aérea apenas como “Dan Cooper”, embarcou no voo 305 da empresa Northwest Airlines na rota Portland – Seattle, uma curta viagem de 30 minutos que era realizada pelos então eficientes jatos Boeing 727.
Era véspera do feriado norte-americano de “Ações de Graça”, comemorado no dia 25 de novembro, por isso o movimento nos aeroportos estava frenético, com inúmeros embarques e desembarques realizados a todo momento. E sem controle de segurança.
Representação artística de como pode ter sido a espetacular fuga de ‘Dan Cooper’ (Photobucket)
O voo 305 descolou exatamente às 14:30 com cerca de 1/3 de ocupação e quando o avião alcançou a altitude de cruzeiro, Dan Cooper, sentado no assento 18C da aeronave (no corredor), acendeu um cigarro, pediu uma dose de uísque e logo em seguida um refrigerante.
Satisfeita a sede, Cooper entregou um bilhete à comissária de bordo Florence Schaffner, que o guardou na bolsa sem conferi-lo, pensando se tratar de mais um passageiro querendo seu telefone. O passageiro, aparentemente com 40 anos, vestia terno escuro bem passado, gravata preta, sapatos mocassins e carregava uma maleta preta.
Alguns minutos após entregar o bilhete e não ter nenhuma resposta da aeromoça, Dan Cooper abordou Florence enquanto passava pelo corredor e sussurrou: “Senhorita, é melhor você olhar aquele bilhete. Eu tenho uma bomba”. E assim começou o sequestro do 727 da Northwest.
O avião da Northwest foi sequestrado na véspera do movimentado feriado de “Ações de Graças” nos EUA (Northwest Airlines)
Raptando o avião em silêncio
No bilhete que Cooper entregou à comissária estava escrito: “Tenho uma bomba na minha maleta. Vou usá-la se necessário. Quero que você se sente ao meu lado. Você está sendo sequestrada”. Florence atendeu o pedido do passageiro sentando-se ao seu lado e imediatamente pediu para ver a suposta bomba na maleta.
Bilhete de embarque da Northwest com o nome Dan Cooper, único
registo do passageiro que sequestrou avião
Segundo o relato da comissária, a mala continha um dispositivo com oito cilindros vermelhos ligados por fios a uma bateria. Depois de fechar a maleta Cooper apresentou suas exigências: duzentos mil dólares, quatro paraquedas (dois primários e dois de reserva), e um caminhão de combustível esperando em Seattle para reabastecer a aeronave, que voltaria a descolar.
Florence então deixou o assento, seguiu para a cabine de controle e transmitiu o pedido do sequestrador à tripulação. Ao retornar, Dan Cooper usava um óculos escuros, que seria mantido até o desfecho da ação.
William Scott, comandante do voo 305, contactou o controle de tráfego aéreo do Aeroporto de Seattle, que por sua vez informou às autoridades locais e federais. A bordo do avião, os outros 36 passageiros foram informados que sua chegada a Seattle seria atrasada por conta de uma “pequena dificuldade mecânica”. A tripulação e o sequestrador não queriam causar pânico.
Temendo o pior dos cenários, Donald Nyrop, presidente da Northwest na época do ocorrido, autorizou o pagamento do resgate e ordenou que todos os funcionários cooperassem com o sequestrador. A aeronave voou em círculos por aproximadamente duas horas até a polícia de Seattle e o FBI reunirem todo o dinheiro exigido e os paraquedas, além de mobilizar o pessoal em terra para uma eventual emergência.
A comissária Florence, que durante a maior parte do voo ficou ao lado do sequestrador, relatou que ele parecia conhecer bem o terreno local, mesmo visto do alto. Conforme relato da tripulante, Cooper comentou: “parece Tacoma lá em baixo”, no momento em que o avião sobrevoava a cidade.
Procurado: Dan Cooper nunca foi encontrado
Florence descreveu o sequestrador como uma pessoa calma, educada e aparentemente bem letrada, um esteriótipo totalmente diferente de outros sequestradores de aviões, geralmente enfurecidos e duros no tratamento com os passageiros e tripulantes, ou então, especialmente nos anos 1970, dissidentes políticos querendo voar dos EUA para Cuba.
Tina Mucklow, outra comissária de bordo do voo 305, concordou. “Ele não estava nervoso”, contou aos investigadores, “Ele parecia bastante agradável. Nunca foi cruel ou mau. Ele ficou pensativo e calmo o tempo todo”. Na fase final do voo, Cooper pediu mais um uísque e pagou pela bebida, insistindo para que Florence ficasse com o troco. O sequestrador ainda sugeriu que fossem incluídas refeições para a tripulação durante a parada em Seattle.
Cooper foi informado às 17h24 que suas exigências haviam sido cumpridas, e às 17h39 a aeronave pousou no Aeroporto de Seattle. Ele instruiu o comandante a taxiar até uma área isolada e bem iluminada e apagar todas as luzes da cabine para impedir a ação de snipers da polícia. Al Lee, gerente de operações de Northwest em Seattle, aproximou-se da aeronave com roupas civis (para evitar que Cooper confundisse o uniforme da companhia com o de policial) e entregou à comissária Mucklow, pelas escadas traseiras, uma mochila com o dinheiro e os quatro paraquedas. Assim que a entrega foi finalizada, Cooper permitiu que Schaffner, a comissária sénior Alice Hancock e todos os passageiros, que haviam acabado de descobrir que eram reféns, saíssem da aeronave.
Agentes do FBI reuniram o dinheiro de vários bancos da área de Seattle. Foram separadas e fotografadas em microfilme dez mil notas de vinte dólares, muitas das quais com o número de série começando com a letra “L” indicando impressão pelo Banco Central Federal de São Francisco, a maioria carregando a designação “Série 1969-C”. Cooper recusou os paraquedas militares, inicialmente oferecidos pelas autoridades, para evitar possíveis sabotagens, exigindo modelos civis com cordas de abertura operadas manualmente. A polícia de Seattle os conseguiu somente em uma escola de paraquedismo local.
De volta ao ar
Enquanto o Boeing da Northwest ficou parado para o reabastecimento, Cooper explicou seu plano de voo para a tripulação na cabine. O avião deveria seguir em direção a Cidade do México na velocidade mínima possível sem estolar a aeronave (sem perder sustentação) e a uma altitude de três mil metros. Ele ainda especificou que o trem de pouso permanecesse baixado, que os flaps fossem mantidos em 15° e que a cabine de passageiros deveria ser despressurizada.
O último pedido do sequestrador, porém, foi negado. Cooper ainda pediu que o avião descolasse com a porta traseira aberta, um curioso detalhe peculiar do Boeing 727. A exigência foi negada pela Northwest, que afirmou ser um procedimento muito perigoso. Cooper afirmou que era, sim, seguro, mas que não discutiria o assunto com a companhia: ele mesmo abriria a porta com o avião no ar.
Momento em que o 727 era reabastecido em Portland, após os passageiros
serem liberados
Às 19h40 aproximadamente, o 727 descolou com Cooper, dois pilotos, um engenheiro de bordo e a comissária-chefe Tina Mucklow. Dois caças Convair F-106 Delta Dart seguiram a aeronave, um acima e outro abaixo, para não serem vistos pelo sequestrador. Um terceiro avião militar, um Lockheed T-33 também participou da operação até ficar sem combustível e pousar na Califórnia.
Após a descolagem, Cooper mandou Mucklow se juntar ao resto da tripulação na cabine e ficar com a porta fechada. Enquanto se dirigia até lá, ela viu Cooper amarrando alguma coisa em sua cintura. Por volta das 20h, uma luz acendeu na cabine indicando que o mecanismo da escada traseira havia sido acionado. A tripulação perguntou a Cooper através do intercomunicador se ele precisava de ajuda, e ele respondeu dizendo simplesmente “Não!”.
O jato da Northwest foi acompanhado por caças Convair F-106 Delta Dart (USAF)
Às 20h13, a secção da cauda do avião sofreu um súbito movimento ascendente, grande o bastante para precisar de correção por parte dos pilotos, que as nivelou novamente. Momentos depois, a cabine de passageiros parecia estar vazia.
Scott e o co-piloto William Rataczak pousaram o 727 com segurança, ainda com a escada traseira abaixada, no Aeroporto de Reno, em Nevada, por volta das 22h15. Agentes dos FBI, policiais estaduais e a polícia de Reno cercaram a aeronave e iniciaram uma busca pelo interior do Boeing a procura do sequestrador. Mas ele havia desaparecido. Os caças que seguiam o Boeing também não relataram terem visto alguém saltando.
Onde Dan Cooper foi parar?
Dan Cooper realmente pulou de paraquedas com US$ 200 mil pela porta traseira do Boeing 727. Não existe nenhuma outra explicação. Agentes do FBI encontraram 66 impressões digitais não identificadas a bordo do avião da Northwest, a gravata preta do sequestrador e dois dos quatro paraquedas, um dos quais havia sido aberto, possivelmente para certificar se tudo estava correto. Foram entrevistadas testemunhas em Portland, Seattle e Reno, e todos os indivíduos que interagiram pessoalmente com Cooper. Uma série de retratos falados foram desenhados a partir dos testemunhos.
Terá ‘Dan Cooper’ sobrevivido a fuga pela porta traseira do Boeing 727? (Anynobody)
Durante a investigação foram considerados alguns suspeitos, mas todos acabaram descartados, especialmente após o FBI traçar o possível perfil do sequestrador. Devido a forma como Dan Cooper se comportou na aeronave, identificando pontos pelo alto, os pedidos sobre como configurar o avião para seu plano e o conhecimento sobre paraquedas, chegou-se a conclusão de que o suspeito pode ser um ex-militar da Força Aérea dos EUA.
Além disso, seria preciso alguém com habilidades especiais na selva para sobreviver no local do suposto salto, uma região cercada por florestas. Não só isso, ainda era inverno e estava nevando no trecho por onde o avião voava.
O Boeing 727 contava com uma curiosa porta de embarque na cauda (Photobucket)
O caso voltaria à tona novamente em 1980. Brian Ingram, então um garoto de apenas oito anos, encontrou três pacotes com dinheiro enterrados em Columbia River, em Washington, região onde Cooper supostamente pode ter pousado. Após análise das células, já bastante deterioradas, confirmou-se que eram as notas de 20 dólares com os números de série entregues ao sequestrador.
Ao analisar os pacotes e o local onde foram encontrados, o FBI concluiu que eles não foram colocados ali de propósito e que podem ter sido perdidos pelo sequestrador durante sua fuga espetacular pela porta traseira do 727.
Se Dan Cooper sobreviveu ou não, ninguém sabe. Teorias apontam que sua fuga poderia ter sido mortal devido ao frio durante a queda. A três mil metros de altura e no inverno, as temperaturas caem bruscamente para -40°. Além disso, o sequestrador teria que sobreviver ao isolamento na floresta do parque nacional de Columbia River e à neve, até alcançar uma estrada. Nessas condições, Cooper poderia ter simplesmente abandonado o dinheiro, aliviando o peso de sua bagagem. Ou morreu tentando.
Desde os pacotes de dinheiro encontrados, nenhuma outra evidência concreta sobre o caso foi descoberta. O caso do voo 305 permanece aberto até hoje e continua sendo o único sequestro aéreo não solucionado na aviação. Após o incidente com a Northwest foi determinado que as portas traseiras de todos os 727 em serviço nos EUA fossem bloqueadas e nos anos seguintes as autoridades começaram a dar mais atenção à segurança na aviação comercial.
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