A Bomba de hidrogênio que a Coreia do Norte diz ter testado tem uma capacidade de destruição milhares de vezes superior ao das bombas libertadas em Hiroshima e Nagasaki, em 1945.
Já passaram 70 anos desde que os Estados Unidos lançaram as bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki, no Japão. Agora, a Coreia do Norte diz ter conseguido detonar uma bomba de hidrogênio. As imagens de destruição e as dezenas de milhares de mortes do “Little Boy” e do “Fat Man” perduram na história mundial, mas a explosão de uma bomba deste tipo pode ser “vários milhares de vezes mais potente que a bomba de Hiroshima”, explicou ao Observador Nuno Barradas, supervisor do Reator Português de Investigação (RRI) no Campus Tecnológico e Nuclear do Instituto Superior Técnico. Para perceber quão potente é o processo lembre-se que são as reações de fusão do hidrogênio que aquecem o nosso Sol.
Cisão versus fusão
Isótopos são núcleos de um mesmo elemento, com o mesmo número de prótons dentro do núcleo, mas um número variável de nêutrons. No caso do urânio, os isótopos mais comuns são o urânio-238, com 146 nêutrons no núcleo, e o urânio-235, com 143 nêutrons.
Numa bomba atômica usa-se urânio-235 ou plutônio-239, isótopos radioativos e instáveis. Estes núcleos, quando bombardeados com nêutrons, dividem-se (cisão ou fissão) originando núcleos mais estáveis ao mesmo tempo que libertam nêutrons e energia, muita energia. E, claro, a radiação libertada afetará os seres vivos na área durante muito anos após a explosão.
Numa reação de fusão, como a que ocorre nas bombas de hidrogênio, não existe uma divisão de um núcleo grande, como o urânio, mas uma fusão de núcleos muito pequenos (com uma massa muito menor). O que faz com que “por grama de combustível, a fusão seja muito mais potente”, referiu Nuno Barradas. Além disso, a cisão liberta sete vezes menos energia do que a fusão do hidrogênio.
A energia libertada corresponde à diferença de estabilidade, ou seja, quanto mais estável o núcleo (ou núcleos) formado, maior a energia libertada, explicou o físico do RRI. A cisão do urânio origina núcleos mais estáveis do que o do elemento original, mas a fusão de dois núcleos de hidrogênio origina hélio, “o núcleo mais estável que existe”.
Além disso, enquanto a bomba atômica precisa de, pelo menos, 25 quilogramas de urânio-235 para que se dê uma reação, a bomba de hidrogênio não tem um limite mínimo de material para que ocorra fusão. Daí o receio de que se crie uma bomba tão pequena que possa ser colocada num míssil, noticiou o jornal britânico The Guardian. Por outro lado, quanto mais hidrogênio tiver a bomba, mais potente será a explosão.
Como juntar dois núcleos de hidrogênio?
A primeira dificuldade é conseguir juntar dois núcleos de hidrogênio, que têm ambos cargas positivas e que, à partida, se iriam repelir um ao outro. Este processo acontece naturalmente no interior do Sol, onde as pressões e temperatura são muito altas. Mas na Terra não é possível recriar essas condições.
Portanto, para fazer com que os dois núcleos de hidrogênio se fundam, é preciso envolvê-los com várias cargas explosivas, que rebentem todas ao mesmo tempo e que obriguem os núcleos a juntarem-se, explicou Nuno Barradas. Estas cargas explosivas podem ser várias bombas atômicas do mesmo tipo que a bomba de Hiroshima ou um invólucro contínuo de explosivos, mas na verdade não se sabe ao certo, porque os modelos produzidos até agora nunca foram divulgados, referiu o físico.
Existem três isótopos para o átomo de hidrogênio: o prótio (1 próton sem nêutrons), o deutério (1 próton e 1 nêutron) e o trítio (1 próton e 2 nêutrons).
Na reação são usados dois isótopos de hidrogênio, normalmente deutério e trítio, mas como explicou Nuno Barradas o trítio tem de estar presente para que a reação seja mais eficiente. Esta fusão liberta muita energia sob a forma de calor, daí também se chama termonuclear, mas não liberta radiação. A radiação libertada durante a explosão de uma bomba H vem toda das explosões atômicas que envolvem os núcleos de hidrogênio.
Que tecnologia é necessária?
Para criar uma bomba de hidrogênio é preciso ter desenvolvido algumas tecnologias e capacidades, como explicou Nuno Barradas.
Ser capaz de fabricar bombas atômicas do tipo de Hiroshima, logo ter capacidade para enriquecer o urânio (ou poder comprá-lo).
Ter uma tecnologia associada que permita que a explosão das bombas atômicas, que envolvem os núcleos de hidrogênio, aconteça toda ao mesmo tempo.
Poder produzir e renovar o trítio, que além de não existir na natureza, tem de estar sempre a ser renovado – é muito radioativo e vai decaindo ao longo do tempo.
Mas Nuno Barradas que o modelo inicial que conhece pode ter sido modificado e que em relação à Coreia do Norte ninguém sabe que tipo de tecnologia poderão estar a usar.
Quem já testou bombas H?
A primeira bomba termonuclear, “Ivy Mike”, foi produzida nos Estados Unidos e testada em 1952, no atol Enewetak, no oceano Pacífico, referiu The Wall Street Journal. Um ano depois, uma bomba equivalente foi detonada na Sibéria, Rússia.
O Reino Unido deixou cair uma bomba de hidrogênio na ilha Malden, no Pacífico, em 1957. Mais tarde, em 1967, a China detonou uma bomba H no local de teste Lop Nur e a França fez o mesmo, no sul do Pacífico, um ano mais tarde.
Outros países, como a Índia, Paquistão, Israel e Coreia do Norte, que têm realizado testes com armas nucleares, poderão ter também capacidade para criar bombas de hidrogênio.
Fonte: TheGuardian