Caixa branca

18/10/2014

 

Olá pessoal, aqui estou eu, Igor Cesar S. de Castro, trazendo-lhes mais um conto. Espero que gostem e desculpem-me pela ausência =)

Os carros quase não passavam naquela rua e talvez nenhum houvesse passado por lá ainda. Apenas algumas pessoas perambulavam cordialmente pelas vielas e calçadas. Entre essas pessoas estava um rapaz jovial de aparência simples que caminha rumo a última estadia daquele quarteirão. Veria muito em breve a sua namorada – a quem ele revogava infidelidade –, precisava pedir desculpas pelas suspeitas de adultério vindas de todas as partes da cidade que de certa forma a acusavam – justamente – de ter cometido um ato tão vergonhoso.

Seus dedos estavam frios e o seu corpo, trêmulo. A cada passo que dava ele tornava repensar o que seria mais cabível. Palavras mais apropriadas para serem postas adjacentes aos seus termos de contestamento. Muito embora tivesse excelentes frases elaboradas e argumentos mais do que necessários – inda achava-se prescindível – e reclamava que tais orações seriam supérfluas para um pedido de perdão. Outrora, também presenciara afundo discussões difusas em seu interior. Sobre o mesmo assunto – que deveria largar de ser besta e voltar logo para casa, ao invés de ficar correndo atrás de quem não merece sequer um de seus fios de cabelo –, palavras presentes na sua mente colidiam com a reclamação do subconsciente, que é o responsável por lhe dizer o que é certo a se fazer.

A porta estava alguns metros à frente. Quando se aproximou um pouco mais, escorou-se em um dos umbrais e pôs-se a pentear os cabelos – ainda estando mais trêmulo do que antes –; estavam úmidos e ásperos, apenas alguns tapas foram suficientes para colocá-los no lugar.

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Tocou a campainha – dois toques seriam necessários – estava ansioso, não esperava ser recebido com sorrisos, portanto, preparava-se para o pior. A garota desceu habilmente e manteve um sorriso brando no rosto. Estava com fones de ouvido engatados nas orelhas e os seus cabelos, embora despenteados, deixavam-na mais bonita. Ainda mais do que já era – É o Alfredo! Só pode ser! – Ela pensava. Abriu a porta calmamente e ainda sorrindo, mas logo aquele sorriso viçoso se desfez quando notou a presença indesejada:

– Lucas?

– Julia!

– O que você quer?

– Será que nós podemos conversar?

– Ainda mais do que já conversamos? – Ela resmungava conforme ele mantinha os olhos frenéticos em sua direção. Ponderando o mesmo olhar calmo e brio, que por hora açoitava-lhe por demonstrar tamanha falta de prazer.

– Mas nós temos que conversar!

– Chega, Lucas! – Resmungou novamente – Vá embora. Eu nem sei o que você está fazendo aqui!

– Mas… – Antes que ele impusesse qualquer palavra. A porta foi fechada. Os chocolates e as flores não foram entregues, porque ele nem sequer teve a chance de dizer o que tanto queria.

Desfeito e mais descontente do que já estava, foi-se embora pela mesma rua. A mesma que sempre fora tão monótona, de pouca movimentação que a fazia famigerar-se de tão taciturna. Não haveria movimentação naquela rua no dia em questão – mas por algum motivo houve – e aquele jovem não queria estar no centro dela, mas infelizmente estava.

O motorista freou bruscamente ao visualizá-lo. Porém, o garoto já encontrava-se sobre o capô. Não seria uma mera freada que impediria o garoto de ser atingido. Quando o carro cessou, realmente, o garoto já estava morto. Foi tudo tão depressa.

Na mesma noite, a grota soube do que havia ocorrido com o namorado. Chorou. Como nunca havia chorado e talvez como jamais choraria em toda a sua vida. Fez-se de pranto. Não podia acreditar que aquela tragédia havia acontecido. O pior de tudo era que ela subjulgava-se em todos os momentos do dia – nada mais justo –; chorou durante duas semanas até que, enfim, se deu conta de que não poderia chorar para sempre. Mediante a tudo que lhe ocorrera, de toda a dor que sentiu por ter mentido para ele. Simplesmente esqueceu-se. Bastou que ele morresse para que ela se desse conta do quão ridícula estava sendo. Jamais se perdoaria pelo seu comportamento tão exoticamente devasso. Libertinava-se a níveis extremos – e talvez tenha sido esse, o fator que acendeu as suspeitas do rapaz –, ela finalmente havia se esquecido do porquê de tanto ter chorado nos últimos dias.

Quando tudo se assentou, duas semanas depois, talvez três. Ela recebeu um presente. Estava na sala assistindo televisão, sozinha, durante a noite. Alguém tocou a campainha. Ela levantou-se para atender, mas não havia ninguém lá. Tudo o que se via era uma rua ainda mais branda. Encostou a porta novamente e antes que a fechasse por completa, ouviu um estranho farfalhar vindo do lado de fora. Abriu a porta e lá estava o seu presente. Uma caixa branca.

Assustada, a garota deu alguns passos para frente e olhou em volta. Não havia ninguém. Aquela era uma das vizinhanças mais monótonas de toda a cidade. Em virtude disso, não estava tão monótona assim. Quando sentiu-se segura, abaixou-se e apanhou a tal caixa. Ainda estando do lado de fora, quis abri-la.

A caixa tinha um semblante aprazível – laços plausíveis juntavam-se em um nó para apreender aquela magnífica embalagem límpida e clara –, tão clara que parecia florescer a luz da lua de maneira translucida ao rosto daquela moça.

Havia um anexo junto ao presente, um bilhete de plástico que estava dentro de um envelope vermelho. Nele estava escrito uma frase tanto quanto comum e ela gostou do que leu.

“Meu coração pertence a você!”

Não conteve a curiosidade e começou a desembrulhar rapidamente – muito se fala sobre os curiosos – Puxou os laços de uma única vez. Fez farfalhar o embrulho e levantou a tampa da caixa.

Desmaiou quando viu. O órgão vermelho que palpitava.